setembro 21, 2024

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O sistema de escore de crédito no Brasil limites legais e incidência de indenização por danos morais

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O sistema de escore de crédito não é um cadastro ou banco de dados de consumidores. Trata-se de uma metodologia de cálculo do risco de crédito, ou seja, uma ferramenta estatística para avaliação do risco de concessão do crédito. Havendo utilização de informações sensíveis e excessivas, ou no caso de comprovada recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados, é cabível a indenização ao consumidor

Fonte: Alice Saldanha Villar

1. O sistema de escore de crédito: definição e previsão legal

De acordo com Schrickel, crédito “é todo ato de vontade ou disposição de alguém de destacar ou ceder, temporariamente, parte do seu patrimônio a um terceiro, com a expectativa de que esta parcela volte a sua posse integralmente, depois de decorrido o tempo estipulado.”[1]

O sistema de escore de crédito (escore = pontuação) também chamado “credit scoring” ou “credscore”, é um método desenvolvido para avaliação do risco de concessão de crédito, a partir de modelos estatísticos, considerando diversas variáveis, com atribuição de uma pontuação ao consumidor avaliado (nota do risco de crédito.  O objetivo é classificar os solicitantes de empréstimo ou financiamento de acordo com a sua probabilidade de inadimplência.

O escore de crédito indica, de maneira estatística, a probabilidade de inadimplência de um determinado grupo ou perfil no qual um consumidor se insere, avaliando os prováveis comportamentos de pagamento do solicitante de crédito. Assim, o escore pode ser utilizado para classificação de créditos como adimplentes ou inadimplentes, bons ou maus, desejáveis ou não, de acordo com a pontuação obtida por cada crédito. A classificação feita a partir do escore de crédito do indivíduo pode orientar a decisão concessão ou não do crédito solicitado.

A prática comercial do escore de crédito é lícita no Brasil, estando autorizada pelo art. 5º, IV, e pelo art. 7º, I, da Lei n. 12.414/2011 (lei do cadastro positivo). Confira:

CDC. Art. 5º São direitos do cadastrado: IV – conhecer os principais elementos e critérios considerados para a análise de risco, resguardado o segredo empresarial;(…)

Lei n. 12.414/2011. Art. 7º As informações disponibilizadas nos bancos de dados somente poderão ser utilizadas para: I – realização de análise de risco de crédito do cadastrado;

2. Natureza e limites legais dos sistemas de escore de crédito

Muitas controvérsias surgiram a respeito da natureza dos sistemas de escore de crédito e a possibilidade de violação a princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor capaz de gerar indenização por dano moral.

Instado a se manifestar, o STJ firmou o entendimento de que o escore de crédito não constitui um cadastro ou banco de dados de consumidores. Trata-se apenas de uma metodologia de cálculo do risco de crédito, utilizando-se de modelos estatísticos e dos dados existentes no mercado acessíveis via internet.[2]

A instituição ou empresa que for aplicar o método do escore de crédito não precisa de autorização do consumidor. Entretanto, na avaliação do risco de crédito, deve ser respeitada a tutela da privacidade e a máxima transparência nas relações negociais, conforme previsão do CDC e da Lei n. 12.414/2011.[3]  Sendo assim, apesar de desnecessário o consentimento do consumidor consultado, devem ser a ele fornecidos esclarecimentos, caso solicitados, acerca das fontes dos dados considerados (histórico de crédito), bem como as informações pessoais valoradas.[4]

Além disso, as informações a serem consideradas no sistema de escore de crédito devem respeitar limitações temporais estabelecidas pelo CDC e pela Lei n. 12.414⁄2011, que são de 5 anos para os registros negativos (CDC) e de 15 anos para o histórico de crédito (Lei n. 12.414⁄2011, art. 14).

Cumpre observar que as empresas que prestam o serviço de scoring não têm o dever de revelar a fórmula do cálculo ou o método matemático utilizado. No entanto, devem informar ao titular da pontuação os dados utilizados para que tal valor fosse alcançado na avaliação de risco de crédito. Conforme destacou o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, “a metodologia em si constitui segredo de atividade empresarial, naturalmente não precisa ser revelada. Mas a proteção não se aplica aos dados quando exigidos por consulta pelo consumidor”.

Esse entendimento culminou na criação da Súmula 550 do STJ, em outubro de 2015, verbis:

Súmula 550: A utilização de escore de crédito, método estatístico de avaliação de risco que não constitui banco de dados, dispensa o consentimento do consumidor, que terá o direito de solicitar esclarecimentos sobre as informações pessoais valoradas e as fontes dos dados considerados no respectivo cálculo.

As informações, quando solicitadas, devem ser prestadas com clareza e precisão, inclusive para que o consumidor possa retificar dados incorretos ou desatualizados, para poder melhorar a performance de sua pontuação. Além disso, é essencial a transparência para que o consumidor possa avaliar o eventual uso de informações sensíveis (como origem social, cor da pele, orientação sexual etc.), podendo impedir discriminações.

Em suma: o consumidor tem o direito de conhecer os dados que embasaram sua pontuação. Sendo assim, há interesse de agir para a exibição de documentos sempre que o autor pretender conhecer e fiscalizar documentos próprios ou comuns de seu interesse, notadamente referentes a sua pessoa e que estejam em poder de terceiro, sendo que “passou a ser relevante para a exibitória não mais a alegação de ser comum o documento, e sim a afirmação de ter o requerente interesse comum em seu conteúdo”.[5]

3. Incidência de indenização por danos morais

A simples existência de nota desfavorável ao consumidor solicitante de crédito não dá margem a indenização por dano moral. No entanto, havendo utilização de informações sensíveis e excessivas, ou no caso de comprovada recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados, é cabível a indenização ao consumidor.

Nessa linha, conforme destacou o ilustre Ministro Paulo de Tarso Sanseverino:

“O desrespeito aos limites legais na utilização do sistema escore de crédito configurando abuso de direito (art. 187 do CC), pode ensejar a responsabilidade objetiva e solidária do fornecedor do serviço, do responsável pelo banco de dados, da fonte e do consulente (art. 16 da Lei n. 12.414/2011) pela ocorrência de danos morais nas hipóteses de utilização de informações excessivas ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I e II, da Lei n. 12.414/2011), bem como nos casos de recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados”. [6]

Conclusão

O sistema de escore de crédito não é um cadastro ou banco de dados de consumidores. Trata-se de uma metodologia de cálculo do risco de crédito, ou seja, uma ferramenta estatística para avaliação do risco de concessão do crédito.

O escore de crédito é um método legal de avaliação de risco e independe da autorização do consumidor. Porém, exige-se o cumprimento das seguintes exigências:

1.  Tutela da privacidade e transparência nas relações negociais: O consumidor tem o direito de conhecer os dados que embasaram sua pontuação. Portanto, devem ser a ele fornecidos esclarecimentos, caso solicitados, acerca das fontes dos dados considerados (histórico de crédito), bem como as informações pessoais valoradas.

2.  Limitações temporais: As informações a serem consideradas no sistema de escore de crédito devem respeitar limitações temporais estabelecidas pelo CDC e pela Lei n. 12.414⁄2011, que são de 5 anos para os registros negativos (CDC) e de 15 anos para o histórico de crédito (Lei n. 12.414⁄2011, art. 14).

Ressalte-se que a simples existência de nota desfavorável ao consumidor solicitante de crédito não dá margem a indenização por dano moral. No entanto, havendo utilização de informações sensíveis e excessivas, ou no caso de comprovada recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados, é cabível a indenização ao consumidor.

NOTAS

[1] Cf. SCHRICKEL, Wolfgang Kurt. Análise de crédito: concessão e gerência de empréstimos. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1997, p. 25.

[2] Cf., nessa linha: STJ – REsp 1457199 RS, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 2ª Seção, DJe 17/12/2014

[3] Cf., nessa linha: STJ – REsp 1457199 RS, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 2ª Seção, DJe 17/12/2014

[4] Idem.

[5] Cf. SILVA, Ovídio A. Batista da. Do processo cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 376. – Citado no REsp 1457199 RS, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 2ª Seção, DJe 17/12/2014

[6] Cf., nessa linha: STJ – REsp 1457199 RS, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 2ª Seção, DJe 17/12/2014

Autora: Alice Saldanha Villar é Advogada e autora dos livros “Direito Sumular – STF” e Direito Sumular – STJ”, Editora JHMIZUNO, São Paulo, 2015 – Prefácio do Ministro Luiz Fux.

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