maio 14, 2024

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Desconsideração Inversa no Novo CPC: calcanhar de Aquiles da justiça

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A garantia de razoável duração do processo mede-se desde o ingresso em juízo até a efetiva satisfação do direito. A execução, portanto, torna-se a pedra de toque da prestação jurisdicional. O Novo Código de Processo Civil traz expressamente o mecanismo da desconsideração da personalidade jurídica como instrumento de eficiência da justiça. Urge analisarmos.

Por | Cristiano Aparecido Quinaia

Aquiles, filho do Rei Peleus e da Deusa Tétis, figura da mitologia grega, conta-se que era invulnerável graças ao banho que recebeu nas águas do Rio Estige. Seu ponto fraco: apenas o calcanhar, por onde foi segurado.  No calcanhar foi atingido por Heitor, vindo a sucumbir.

No processo civil o ponto vulnerável sempre foi considerado a fase de execução. De nada adianta ganhar se não puder ser satisfeita a obrigação. São vastas as situações nas quais o credor que obtém um título judicial, ou aquele que sustenta um título de crédito, não localiza bens desembaraçados.

O Brasil, país de território continental, facilita o trânsito de pessoas naturais e jurídicas. Expliquemos. É comum a situação do sócio que encerra uma empresa em um Estado e a abre em outro, ou se retira de um ramo de negócio, e se vincula a outro.

Nesses meandros, meses e anos se passam, e o processo de execução se torna uma cansativa sucessão de diligências que são inutilmente praticadas.

A tutela provisória assegura o direito contra o tempo e os fatos humanos. Porém, é na satisfação, na realização de um direito material que o processo se finda ao acaso.

Em 2008, em polêmico caso, nos autos da ação n. 33.453/01 – 16ª Vara Cível de São Paulo, quando do julgamento de agravo de instrumento, o Des. Manoel Calças aplicou pela primeira vez a técnica da despersonificação inversa da personalidade jurídica.

Na ocasião, obtemperou Sua Excelência “A jurisprudência de nossos Tribunais, que já aplicava a desconsideração da personalidade jurídica com base nos princípios que vedam o abuso do direito e da fraude contra credores, passou a aplicá-la com fundamento nos dispositivos legais acima referidos, inclusive a desconsideração inversa da personalidade jurídica”.

A finalidade é esta: impedir que a pessoa natural constitua uma pessoa jurídica e para ela verta todo seu patrimônio, vindo a fraudar seus credores pessoais e, com isso, frustrar o processo de execução.

Também é comum a hipótese de constituição de pessoa jurídica na qual o devedor figura como sócio minoritário, buscando eximir-se das responsabilidades às quais o administrador fica exposto.

Porém, quando se observa a movimentação contábil, constatam-se as retiradas de pró-labore e distribuição de lucros desiguais, indicando claramente tratar-se de mera elucubração.

De lá pra cá, o mecanismo expandiu-se, vindo a ganhar previsão expressa na Lei n. 13.105/2015, o Novo Código de Processo Civil Brasileiro. A Comissão de Juristas do Novo CPC objetivou, acima de tudo, tornar razoável a duração do processo.

Não se pode descurar que a celeridade da tramitação tornou-se garantia fundamental das pessoas a partir da Reforma do Judiciário, com a Emenda Constitucional n. 45 de 2004. É o que nos assegura o art. 5º, inciso LXXVIII.

Mas, superar a quantidade exige, além de eliminar o estoque de processos existentes, evitar que os futuros venham a se prolongar indefinidamente e, para isso, são necessárias técnicas capazes de rápida e eficazmente conceder a quem tem o direito exatamente aquilo a que faz jus, parafraseando o mestre Chiovenda.

Assim, além da desconsideração tradicional, o Novo CPC previu no art. 133 o instituto da desconsideração inversa, dispondo no §2º: Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.

Por esta previsão, fica autorizado o magistrado a aplicar em constatar se no caso a fraude está com o abuso da administração, ou, se o sócio se esconde por detrás do manto fictício da personificação da empresa.

Verificada a fraude, será autorizado a prosseguir com a execução em desfavor do patrimônio amealhado à custa da falência ou crise alheia. O mecanismo precisa ser conhecido e efetivamente aplicado.

Recentemente, tivemos no interior de São Paulo, um caso de aplicação da técnica, no qual a magistrada prudentemente aferiu a presença dos pressupostos, decidindo: “O pedido de desconsideração da personalidade jurídica inversa consoante formulado pela parte demandante, de uma análise preliminar em cotejo com o contido no processo, preenche os pressupostos para ser deferido”.

Nem se diga que o mecanismo viola a ampla defesa e/ou contraditório, pois, o incidente pressupõe a citação da pessoa jurídica e possibilita o exercício do contraditório. O que é fundamental: o processo de execução não para.

Autor: Cristiano Aparecido Quinaia é Mestrando em Direito Constitucional (ITE-SP). E-mail: cquinaia@gmail.com

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