setembro 21, 2024

Raul Gerolimich Consultoria Jurídica e Imobiliária

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Seguro de automóveis facultativo: novas Súmulas 529 e 537 do STJ

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O presente artigo destina-se a esclarecer o comando das novas Súmulas 529 e 537, que disciplinam o seguro de automóveis facultativo. De acordo com a Súmula 529: “No seguro de responsabilidade civil facultativo, não cabe o ajuizamento de ação pelo terceiro prejudicado direta e exclusivamente em face da seguradora do apontado causador do dano”. Já a Súmula 537 fixa o seguinte entendimento: “Em ação de reparação de danos, a seguradora denunciada, se aceitar a denunciação ou contestar o pedido do autor, pode ser condenada, direta e solidariamente junto com o segurado, ao pagamento da indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice”

Fonte: Alice Saldanha Villa

O seguro de automóveis no Brasil pode ser dividido em dois grupos, a saber: o seguro obrigatório (DPVAT – Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres); e o seguro facultativo.  Como é sabido, o DPVAT é um seguro obrigatório estipulado em favor de terceiro por norma legal, quando a responsabilidade é objetiva e basta o evento para que haja o nexo causal.

Já o seguro facultativo não é feito para beneficiar a vítima, mas para garantir o patrimônio do próprio segurado, caso tenha ele que responder por dano causado a terceiro. Numa palavra: o seguro facultativo é contratado exclusivamente em benefício do segurado.

Sendo assim, tratando-se de seguro facultativo, é impossível a ação direta pelo terceiro prejudicado (vítima do sinistro) contra a seguradora, sem ao menos a participação do segurado como co-réu.  Este entendimento deu origem à Súmula 529 do STJ, verbis:

Súmula 529/STJ: No seguro de responsabilidade civil facultativo, não cabe o ajuizamento de ação pelo terceiro prejudicado direta e exclusivamente em face da seguradora do apontado causador do dano.

Conforme explicou o ilustre Ministro Aldir Passarinho Júnior: “a condenação da seguradora somente surgirá se comprovado que o segurado agiu com culpa ou dolo no acidente, daí a necessidade de integração do contratante, sob pena, inclusive, de cerceamento de defesa”.[1] Dito de outra forma: a seguradora detém legitimidade passiva para, em conjunto com o segurado causador do dano, ser demandada diretamente pela vítima.

Cumpre observar que nem sempre a verificação simples dessa responsabilidade civil obrigará a seguradora a pagar a indenização securitária. Conforme aduziu o ilustre Ministro Luis Felipe Salomão: [2]

“Pelo contrário, a depender das circunstâncias em que o segurado se envolveu no acidente, ou seja, a depender do motivo determinante da responsabilidade civil do segurado, a Seguradora pode eximir-se da obrigação contratualmente assumida.

Refiro-me aos típicos casos de agravamento intencional dos riscos pelo segurado, por exemplo, mediante embriaguez voluntária ou por ilícito decorrente de ato doloso de sua parte (art. 762, Código Civil), hipóteses em que, embora o segurado esteja obrigado a indenizar o terceiro, não estará a seguradora obrigada a pagar a indenização securitária.

Assim, figurando-se a hipótese em que o autor alega ter sido “vítima” de acidente automobilístico “causado” por veículo segurado, e tendo a ação sido ajuizada exclusivamente em face da Seguradora, não terá esta meios de defesa para provar eventual inversão na causalidade do acidente e, tampouco, poderá verificar a ocorrência de fato extintivo da obrigação de indenizar, como a embriaguez voluntária do segurado que, no mais das vezes, agrava o risco de sinistro. Consequentemente, sem as exatas dimensões das circunstâncias que envolveram o sinistro, corre-se o risco de a seguradora pagar a indenização exatamente para o real causador do dano.”

É importante ressaltar que não há nenhum prejuízo para quem se afirma vítima de acidente automobilístico, em ajuizar a ação indenizatória contra o segurado em conjunto com a seguradora, conforme determina a Súmula 529 do STJ. Pelo contrário, a regra garante a observância do devido processo legal e segurança jurídica.[3]

Imagine agora a seguinte situação: a vítima (terceiro prejudicado) ajuíza uma ação de indenização apenas contra o suposto causador do dano (segurado) e este, por sua vez, denuncia à lide a seguradora, nos termos do art. 125, II, NCPC.[4] Comparecendo em juízo, a seguradora aceita a denunciação da lide, contesta o mérito do pedido do autor e assume, dessa forma, a condição de litisconsorte passiva. Diante dessa situação, muitas controvérsias surgiram em relação à possibilidade de condenação direta e solidária da Seguradora litisdenunciada. Em outras palavras: seria possível a condenação direta e solidária da seguradora denunciada?

Instado a se manifestar, o STJ firmou o entendimento de que é possível a condenação direta e solidária da seguradora litisdenunciada, nos limites contratados na apólice para a cobertura de danos causados a terceiros. Caso contrário, seria possível imaginar que o segurado obtivesse lucro com o ilícito praticado, na medida em que poderia receber o valor do seguro de responsabilidade civil, sem que automaticamente esse valor fosse repassado à vítima.

Este orientação culminou na criação da Súmula 537 do STJ, verbis:

Súmula 537/STJ: Em ação de reparação de danos, a seguradora denunciada, se aceitar a denunciação ou contestar o pedido do autor, pode ser condenada, direta e solidariamente junto com o segurado, ao pagamento da indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice.

Essa solução decorre da aplicação do princípio da função social do contrato de seguro, ampliando o âmbito de eficácia da relação contratual. Veja-se que “o exato resultado desejado pelo direito material não é outro senão o de que a vítima de dano causado por acidente de veículo automotor seja indenizada, efetiva e prontamente, e que a seguradora suporte, ao fim e ao cabo, esses prejuízos experimentados pelo terceiro, no limite dos valores contratados pelo segurado, depois de reconhecida sua condição de causador do dano”. [5]

Conforme observou o ilustre Ministro Luiz Felipe Salomão, essa solução “satisfaz, a um só tempo, os anseios de um processo justo e célere e o direito da parte contrária (seguradora) ao devido processo legal, uma vez que, a par de conceder praticidade ao comando judicial, possibilita o exercício do contraditório e da ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes”.[6]

Sobre o tema em exame, trazemos à colação os seguintes julgados:

“(…) 1. Comparecendo a seguradora em juízo, aceitando a denunciação da lide feita pelo réu e contestando o pedido principal, assume a condição de litisconsorte passiva.  2. Possibilidade de ser condenada e executada, direta e solidariamente, com o réu. 3. Por se tratar de responsabilidade solidária, a sentença condenatória pode ser executada contra qualquer um dos litisconsortes.  4. Concreção do princípio da função social do contrato de seguro, ampliando o âmbito de eficácia da relação contratual.  (…)” STJ – AgRg no REsp 474.921/RJ, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 3ª TURMA, DJe 19/10/2010.

“(…) A seguradora-litisdenunciada ao oferecer contestação, assume posição de litisconsorte passiva do denunciante. Pode assim, ser condenada em conjunto com este, à indenização por acidente de trânsito. Esta é a interpretação correta e pragmática do Art. 75, I, do CPC.” STJ – REsp 275.453/RS, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, 3ª TURMA, DJ 11/04/2005.

CONCLUSÃO

O seguro de automóveis facultativo é contratado exclusivamente em benefício do segurado. Sendo assim, é impossível a ação direta pelo terceiro prejudicado (vítima) contra a seguradora, sem ao menos a participação do segurado como co-réu.

Ora, a condenação da seguradora somente surgirá se comprovado que o segurado agiu com culpa ou dolo no acidente, daí a necessidade de integração do contratante, sob pena, inclusive, de cerceamento de defesa.

Ressalte-se que se a vítima ajuíza uma ação de indenização apenas contra o suposto causador do dano (segurado) e este, por sua vez, denuncia à lide a seguradora, então a seguradora denunciada poderá ser condenada direta e solidariamente junto com o segurado a indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice. Essa solução decorre da aplicação do princípio da função social do contrato de seguro.

NOTAS

[1] Cf. REsp 256424 SE, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão ALDIR PASSARINHO JUNIOR, 4ª Turma, DJ 07/08/2006.

[2] Cf. Voto do Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO no REsp 962230 RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 2ª Seção, DJe 20/04/2012

[3] Cf., nessa linha: STJ – Voto do Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO no REsp 962230 RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 08/02/2012, 2ª Seção, DJe 20/04/2012.

[4] Cf.  NCPC. Art. 125.  É admissível a denunciação da lide, promovida por qualquer das partes: (…) II – àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem for vencido no processo.

[5] Cf. STJ – Voto do Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO no REsp 925130 SP, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 2ª SEÇÃO, DJe 20/04/2012.

[6] Idem.

Autora: Alice Saldanha Villar é Advogada e autora dos livros “Direito Sumular – STF” e Direito Sumular – STJ”, Editora JHMIZUNO, São Paulo, 2015 – Prefácio do Ministro Luiz Fux.

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