É possível aplicação do rito sumário no porte ilegal de arma de fogo de uso permitido? Questões processuais
Publicado por José Wilson Oliveira Santos
1. Considerações iniciais
Primeiramente é forçoso dizer que o porte de arma de fogo é proibido no Brasil, dado a vedação estatuído pela lei 10.826/2006 [1], a chamada lei de “ armas”, que em seu artigo 14, caput, preceitua as várias formas de conduta que tipificaria o uso indevido ou em desacordo com a legislação regente.
A norma (sentido repressivo), ora em comento, foi elaborada a partir de consulta popular (referendo), onde a sociedade teve a oportunidade de dizer e decidir o que seria e se seria aplicado a legislação (estatuto do desarmamento), de autoria do Constituinte Originário, publicado em 22 de dezembro de 2003 e vigendo a partir de então, mas condicionada a ulterior aval popular.
Foi assim que em 2005, justamente pela característica peculiar desse meio de exercício da cidadania (referendo), outorgado ao povo pela Constituição Federal de 1988 em seu artigo 14 inciso II, [2], o cidadão Brasileiro disse não à comercialização de arma de fogo e munição em todo território Nacional, artigo 35 caput do estatuto.
2. Diferença entre Referendo e Plebiscito.
Os institutos democráticos de manifestação popular chamados de referendo (do latimreferendum), e plebiscito (do latim plebiscitu), que tem status de direito fundamental e garantido pela CRFB/88, (garantia implícita), inserido no rol dos Direitos Políticos, artigo 14 incisos I e II, diferem ente si na forma e no momento (temporal), em que se dá seu espectro de consulta.
Tem-se assim que, no direito latino, o plebiscito é convocado antes da criação danorma (ato legislativo ou administrativo), e é o povo, por meio do voto, que vai aprovar ou não a questão que lhe for submetida. Já o referendo é convocado após a edição da norma, devendo o povo igualmente por meio do voto, ratificá-la ou não.
Foi justamente o que se deu no caso da lei 10.826/2003, com realização do instituto em outubro 2005.
3. Rito Processual no porte ilegal de arma de fogo de uso permitido.
O ritualismo processual nos crimes cometido na lei de armas não é difícil de se verificar, a depender em qual tipo legal -, da lei 10.826/2003 o agente foi enquadrado. Para tanto, no caso ora comentado do artigo 14 da lei supra, um olhar “rápido” e desavisado do intérprete, notadamente dos estudantes de direito em fase de graduação (que por vezes preparam-se para concurso público e exame da Ordem), poderia levá-lo ao equívoco.
Pois bem, se olharmos o tipo penal encartado no artigo 14, caput, do estatuto do desarmamento, logo percebemos (sem interpretação detida) que o procedimento processual adequado seria o rito sumário. Seria! Isso porque o “sutil” descuido exegético do disposto no artigo 394 parágrafo 1º [3] do Código de Processo Penal, conduz à resposta negativa, dado a expressão “ sanção máxima cominada”.
3.1. Benefícios jurisprudencial e legislativo
Dos “males” o menor, o agente que comete o delito encartado no caput do artigo 14da lei do desarmamento, em qualquer dos verbos nele inserido, se não houver a chamada “numeração suprimida”, que aí seria o tipo do artigo 16 parágrafo único da 10.826/2003, foi beneficiado pela Ação direita de Inconstitucionalidade levada a feito pelo Supremo Tribunal Federal, na ADIN nº (3.112-1), vetando com isso, a negativa de aplicação de fiança.
Ademais, com o advento da lei 12.403/2011, [4] que deu nova redação ao artigo 322do CPP, cabe arbitramento de fiança pela autoridade policial para os casos de porte ilegal de arma de fogo, se a sanção máxima cominada não for superior a 4 anos de reclusão.
Ocorre que, no mais das vezes, quando o agente é preso portando arma de uso “permitido”, logo se constata (mesmo antes de exame pericial), artigo 158 do CPP, que a numeração está “suprimida” e isso conduz ao tipo penal do artigo 16 do estatuto, insuscetível pois, de aplicação de fiança em sede policial, devendo o auto de prisão em flagrante ser remetido ao judiciário, e aí sim, o agente poderá pleiteá-la nos termos do parágrafo único do artigo 322 do CPP, redação da lei 12.403/2011.
Questão importante de ser observado é o fato de que os dispositivos tipológico jurídico-penal da lei 10.826/2003 é regulamentado por meio de norma heterogênea, decreto 3.665/2000 [5] no que atine ser ou não proibido determinados calibres de armas, munições e acessórios, orbitando assim, na esfera de competência do exército Brasileiro, regulamentar e fiscalizar em âmbito Nacional (R-105) [6] as armas e produtos de uso restrito artigo166 e permitido artigo177.
Conclui-se com isso que, “aparentemente”, mesmo prescindindo de interpretação aprofundada, mas sempre atento à análise detida do comando legal tocante aos tipos penais encartado no artigo 14 caput e demais dispositivos da lei 10.826/2003, o rito processual a ser seguido é de fundamental importância, notadamente quando se está diante de indagações feita em concurso público ou exame da OAB.
Referências bibliográficas
[1] Lei 10.826/2003 – estatuto do desarmamento;
[2] Constituição Federal de 1988;
[3] Código de Processo Penal – decreto lei 3689/1941;
[4] Lei 12.403/2011;
[5] Decreto lei 3.665/2000;
[6] Regulamento 105 – do Ministério do Exército Brasileiro;