O salário-hora do bancário: uma crítica à alteração da súmula n. 124 do TST
O presente estudo pretende apresentar, por meio de uma revisão bibliográfica, os elementos histórico-jurisprudenciais que informaram a redaçãoo anterior da súmula n. 124 e demonstrar a incorreção da atual redação desse verbete. Outrossim, por meio desses argumentos a serem buscados no material coletado, pretende-se justificar a incorreção da nova redação da súmula e sua necessidade de retorno ao status quo ante como forma, inclusive, de se estabelecer a aplicação adequada do princípio da isonomia entre todos os trabalhadores que atuam na sociedade jurídico-constitucional brasileira
Por | Marlon Carvalho de Sousa Rocha, Renato de Oliveira Luz
1.INTRODUÇÃO
A última revisão da jurisprudência no Tribunal Superior do Trabalho (TST) realizada no mês de setembro de 2012 propiciou uma série de reformas, a edição de diversos novos verbetes e o cancelamento de outros tantos.
Nessa oportunidade, diversos temas controversos foram enfrentados pelo TST como, por exemplo, o da súmula (n. 136) que versava, desde 1982, acerca da inaplicabilidade do “princípio da identidade física do juiz” no processo trabalhista e que foi cancelada.
Dentre essas matérias de destaque, afigurou-se como matéria necessária a um estudo aprofundado a alteração da súmula n. 124 do TST que conferiu novos parâmetros interpretativos no que concerne à fixação do divisor para cálculo do salário-hora do bancário.
Com efeito, embora a determinação do aludido divisor nunca tenha sido um assunto completamente pacificado, sobretudo na jurisprudência, vislumbrou-se, prima facie, que a modificação do entendimento do TST culminou com um equívoco lógico-jurídico e que ofende o costume adotado no que se refere à fórmula matemática para o cálculo do divisor do salário-hora de qualquer trabalhador.
É de se frisar que, conquanto essa questão venha expressamente assentada no art. 64 da CLT, foi adotado, ao longo da história, um parâmetro interpretativo diverso do que se extrai da literalidade dessa norma jurídica e que gerou o mencionado “costume” no que tange ao cálculo do salário hora.
O presente estudo, pois, pretende apresentar, por meio de uma revisão bibliográfica, os elementos histórico-jurisprudenciais que informaram a redação anterior da súmula n. 124 e demonstrar a incorreção da atual redação desse verbete.
Outrossim, por meio desses argumentos a serem buscados no material coletado, pretende-se justificar a incorreção da nova redação da súmula e sua necessidade de retorno ao status quo ante como forma, inclusive, de se estabelecer a aplicação adequada do princípio da isonomia entre todos os trabalhadores que atuam na sociedade jurídico-constitucional brasileira.
O trabalho encontra-se estruturado em três capítulos. No primeiro, aborda-se a lógica jurídica utilizada para a construção do divisor para o cálculo do salário-hora. No segundo tópico, a análise restringe-se a história dos limites da fixação da jornada e do divisor adotado para os bancários. No derradeiro, apreciam-se os precedentes do TST e de outros regionais para, ao cabo, concluir-se acerca da incorreção (ou não) da atual redação da súmula n. 124 do TST.
2. A LÓGICA JURÍDICA PARA A OBTENÇÃO DO DIVISOR PARA O CÁLCULO DO SALÁRIO-HORA: ART. 64 DA CLT
2.1.Qual a necessidade do divisor para o cálculo do salário-hora?
Do ponto de vista prático, é essencial a correta obtenção do valor do salário-hora nas relações jurídico-trabalhistas.
Afinal, tal montante é essencial para a definição dos parâmetros adequados para o cálculo de diversas parcelas devidas por força do contrato de trabalho e que guardam estreita correlação com o valor que é pago por cada hora laborada.
Para os empregados que recebem salário por mês de trabalho, grande maioria no mercado, o disciplinamento legal encontra-se assentado no caput do art. 64 da CLT. Para aqueles que recebem salário por hora, o cálculo está disciplinado no parágrafo único desse mesmo dispositivo.
Nesse passo, para se chegar ao correto valor do salário hora divide-se o salário mensal pelo número de horas no mês que são por esse remuneradas. É preciso lembrar que são pagas não somente as horas trabalhadas, mas também aquelas destinadas ao repouso semanal, entendimento que se extrai do art. 64 da CLT e da Lei 605/49.
Não obstante, como já alertado na introdução, a interpretação literal do art. 64 da CLT gera distorções em virtude dos atuais limites mensal e semanal de jornada para os trabalhadores. Isso porque, pela exegese gramatical desse dispositivo todo e qualquer trabalhador submetido à jornada de 08 (oito) horas diárias estaria submetido ao divisor 240 e não 220.
Transcreve-se o teor dos arts. 64 e 58 (por pertinência) da CLT:
Art. 64. O salário-hora normal, no caso de empregado mensalista, será obtido dividindo-se o salário mensal correspondente à duração do trabalho, a que se refere o art. 58 da CLT, por 30 (trinta) vezes o número de horas dessa duração.
Art. 58 – A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.
Como se lê, a fórmula matemática para o cálculo do divisor seria:
SM : DNT x 30 = Divisor
Donde:
SM – Salário Mensal
DNT – Duração normal do trabalho (art. 58 da CLT)
Assim, com essa fórmula obteríamos os seguintes divisores, conforme fosse a jornada de trabalho:
DURAÇÃO NORMAL DO TRABALHO (DNT) FÓRMULA DIVISOR (c)
8 horas DNT x 30 = c 240
7 horas DNT x 30 = c 210
6 horas DNT x 30 = c 180
Confirma esse posicionamento, o professor e Juiz do Trabalho Rogério Neiva (2012):
“A previsão do divisor se encontra no artigo 64 da CLT.
E o que diz este dispositivo? O referido artigo estabelece que “O salário-hora normal, no caso de empregado mensalista, será obtido dividindo-se o salário mensal correspondente à duração do trabalho, a que se refere o artigo 58, por 30 (trinta) vezes o número de horas dessa duração.”. No caso, vale lembrar que o artigo 58 da CLT estabelece a jornada de trabalho de oito horas.
Portanto, se fosse seguida a literalidade do artigo 64 da CLT, a conta seria a seguinte:
8 hs x 30 dias = 240
Ou seja, no caso, o divisor seria de 240.
Porém, após a CF/88, que assegurou o repouso semanal remunerado e o limite de 44 hs semanais para os empregados em geral, concluiu-se que não seria possível multiplicar o limite de jornada por 30, pois o empregado não trabalharia 30 dias por mês, mas sim 6 dias por semana e considerando determinado limite semanal de horas.
Daí foi estabelecida uma nova metodologia, segundo a qual seria preciso apurar o número médio de horas por dia de uma semana de trabalho, para, em seguida, multiplicar por 30. Esta média de horas-dia a ser multiplicada por 30 seria estabelecida, portanto, a partir de um parâmetro semanal, sendo este o resultado do limite semanal dividido pelo número de dias em que efetivamente se trabalha na semana.”
Não é por outra razão que o divisor para a carga horária daqueles que laboram 44 (quarenta e quatro) horas semanais é 220 (duzentos e vinte), pois a carga horária semanal é dividida por 6 (dias úteis da semana) e multiplicada por 30 (total médio de dias do mês).
A divisão por 6 leva em consideração uma semana de 7 dias, sendo que desses, 6 dias são úteis e 1 dia é destinado ao repouso. Assim encontra-se a média de horas remuneradas de segunda a sábado e multiplica-se por 30 para incluir o repouso semanal que, por lei (Lei n. 605/1949), deve ser remunerado.
No caso do trabalhador comum (44 horas semanais) o divisor 220 é encontrado a partir do seguinte raciocínio:
– Total de horas trabalhadas na semana = 44
– Total de dias úteis da semana = 6
– média diária de horas remuneradas = 44 ÷ 6 = 7,3333 (07h20)
– total de horas remuneradas no mês = 7,3333 x 30 = 220
Passemos, então, à análise do caso dos bancários.
3. O DIVISOR PARA CÁLCULO DO SALÁRIO-HORA DO BANCÁRIO
A determinação do salário hora do bancário nunca foi um assunto completamente pacificado, mesmo porque o art. 224 da CLT, que regula a carga horária para essa categoria de trabalhadores, passou por algumas mudanças ao longo do tempo.
Em sua redação original o art. 224 da CLT já previa a jornada de 6 horas e carga horária de 36 horas semanais:
“Art. 224 Para os empregados em banco e casas bancárias será de seis horas por dia ou trinta e seis horas semanais a duração normal de trabalho, excetuados os que exercerem as funções de direção, gerência, fiscalização, chefes, ajudantes de seção e equivalentes, ou desempenharem outros cargos de confiança, todos com vencimentos superiores ao dos postos efetivos.”
Ou seja, inicialmente, embora a jornada fosse de seis horas, ainda havia trabalho aos sábados.
Assim, não havia maiores problemas em relação ao divisor a ser utilizado.
Contudo, em 1952, a redação do art. 224 da CLT foi alterado pela Lei n. 1540, que embora tenha mantido a jornada máxima de seis horas, reduziu a jornada do sábado para três horas:
“Art. 224 O horário diário para os empregados em banco e casas bancárias, será de seis horas contínuas, com exceção dos sábados, cuja duração será de três horas, perfazendo um total de trinta e três horas de trabalho por semana.”
Em 07 de outubro de1969, com a edição do Decreto-lei n. 915, houve nova alteração na redação no caput do art. 224 da CLT, excluindo o trabalho aos sábados, com a seguinte redação:
“Art. 224 A duração normal do trabalho dos empregados em bancos e casas bancárias será de seis horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de trinta horas por semana.”
Referido Decreto-lei foi revogado expressamente pela Lei n. 4.299, de 23 de dezembro de 1963.
A redação atual dada ao caput do art. 224 da CLT foi conferida pela Lei n. 7.430 de 1985, a qual manteve a redação que era conferida pelo Decereto-lei . 915/1969 quanto à supressão do trabalho aos sábados, incluindo essa jornada para os empregados da Caixa Econômica Federal:
“Art. 224 A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas continuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 (trinta) horas de trabalho por semana.”
Ressalte-se, apenas para efeito de conhecimento, que até o advento da Lei n. 7.430/1985, os empregados de caixas econômicas Federais e autarquias bancárias autônomas estavam sujeitos à carga horária semanal de 40 horas (decreto-Lei nº 266, de 28 de fevereiro de 1967).
A extinção do trabalho aos sábados suscitou intensos debates quanto à natureza desse dia, pois seria bastante razoável concluir que os bancários adquiriram mais um dia de descanso semanal remunerado (SANTOS, 2008, p. 200).
A natureza do sábado era de suma importância para o cálculo de vários direitos trabalhistas, pois além de influir no cálculo do salário-hora, era de vital importância para definir o valor do reflexo de outras verbas no repouso semanal remunerado.
Contudo, embora fosse razoável concluir que a alteração legislativa acrescentou mais um descanso semanal remunerado para os bancários, que passariam a contar com dois descansos semanais remunerados, prevaleceu, nos tribunais, o entendimento de que o sábado para o bancário é “dia útil não trabalhado”, que SANTOS (2008, p. 200) classifica como “uma terceira e estranha entidade”.
Ao que tudo indica, prevaleceu a interpretação literal da redação conferida ao caput do art. 224 da CLT, de onde se extrai que o trabalho do bancário será de seis horas nos dias úteis “com exceção dos sábados”. Ou seja, pela redação do mencionado dispositivo é possível concluir que o sábado compõe os dias úteis da semana.
E SANTOS (2008, p. 134) continua em sua crítica ao entendimento sufragado pelos tribunais em relação à natureza do sábado para os bancários:
“Por esse motivo, as Súmulas 124 e 267/TST mantinham uma sútil contradição com a Súmula 113, pois não é possível compreender a que tipo de remuneração corresponde o sábado dos bancários. Pela compreensão dessas súmulas trata-se de um dia não trabalhado, que é remunerado, mas que não corresponde a um dia de repouso. A interpretação que o TST deu aos dispositivos legais aplicáveis aos bancários criou um terceiro gênero de remuneração, a qual não corresponde a uma retribuição direta pelo trabalho efetivamente prestado nem é remuneração de repouso legal.”
A polêmica discussão deu margem à edição de algumas súmulas pelo TST, que definiram para os bancários, a natureza do sábado e o divisor. Destacam-se nesse sentido as súmulas 113, 124, 267 e 343:
Súmula 113 do TST:
BANCÁRIO. SÁBADO. DIA ÚTIL (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O sábado do bancário é dia útil não trabalhado, não dia de repouso remunerado. Não cabe a repercussão do pagamento de horas extras habituais em sua remuneração.
Súmula 124 do TST (redação original):
BANCÁRIO. HORA DE SALÁRIO. DIVISOR. Para o cálculo do valor do salário-hora do bancário mensalista, o divisor a ser adotado é 180 (cento e oitenta).
Súmula nº 267 do TST (cancelada pela súmula 343 do TST)
BANCÁRIO. VALOR DO SALÁRIO-HORA. DIVISOR (cancelada) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O bancário sujeito à jornada de 8 (oito) horas (art. 224, § 2º, da CLT) tem salário-hora calculado com base no divisor 240 (duzentos e quarenta) e não 180 (cento e oitenta), que é relativo à jornada de 6 (seis) horas.’
Súmula 343 do TST (antes do cancelamento em 14.09.2012):
BANCÁRIO. HORA DE SALÁRIO. DIVISOR. O bancário sujeito à jornada de 8 (oito) horas (art. 224, 2°, da CLT), após a CF/1988, tem salário-hora calculado com base no divisor 220 (duzentos e vinte), não mais 240 (duzentos e quarenta).’ (a redação desta súmula decorreu da revisão da súmula 267)
Apesar das súmulas mencionadas alguns advogados continuaram a pleitear divisores menores. O principal argumento era que, se para o trabalhador comum, submetido à carga horária de 44 horas semanais, o divisor era 220, o bancário submetido à jornada de 6 (seis) horas deveria ter como divisor 150 e não 180, aplicando uma regra de três simples:
Jornada de 44 horas ————- divisor 220
Jornada de 30 horas ————- x
X = (30 x 220) ÷ 44
X = 150
Faziam o mesmo raciocínio em relação ao bancário sujeito à jornada de 8 (oito) horas para pleitear o divisor 200.
Por muito tempo a insistência não encontrou eco na Suprema Corte Trabalhista, que com base em suas súmulas rejeitava a aplicação de divisores menores do que os nelas estabelecidos.
A construção do divisor 180 para o bancário submetido á jornada de 6 horas estava sustentado na premissa de que o sábado, apesar de ser um dia útil não trabalhado (súmula 113 do TST) era remunerado, de modo que todos os dias do mês eram remunerados, seja porque trabalhados, seja porque apesar de não trabalhados eram remunerados (sábados) ou porque eram repousos remunerados (domingos).
O salário hora do empregado mensalista, conforme disposto no art. 64 da CLT, é obtido dividindo-se o salário mensal correspondente à duração do trabalho a que se refere o art. 58 da CLT, por 30 vezes o número de horas dessa duração. Esse raciocínio permite concluir que o valor correspondente ao repouso semanal remunerado é considerado para efeito de se encontrar o salário-hora:
Art. 64. O salário-hora normal, no caso de empregado mensalista, será obtido dividindo-se o salário mensal correspondente à duração do trabalho, a que se refere o art. 58 da CLT, por 30 (trinta) vezes o número de horas dessa duração.
Assim, se o trabalhador bancário era remunerado por seis horas de trabalho todos os dias, o divisor só podia ser 180, pois 6 horas de trabalho diário multiplicado por 30 dias é igual 180 (6 x 30 = 180).
O mesmo raciocínio se aplicava ao bancário sujeito à jornada de 8 horas, de segunda à sexta-feira, para se chegar ao divisor 240 (antes da CF/1988), limitando o divisor a 220 após a CF/1988 (súmula 343, antes do cancelamento) porque esse era o divisor aplicado ao trabalhador comum, cuja carga horária semanal foi reduzida de 48 horas para 44 horas pelo constituinte originário.
A construção de que o sábado era dia útil não trabalhado (mas remunerado) até permitia a conclusão de que, em face da redução da carga horária semanal pela CF/1988, de 48 para 44 horas semanais, o divisor para o bancário sujeito à jornada de 8 horas também passou a ser 220, pois se para o trabalhador comum a jornada máxima semanal era de 44 horas, restariam apenas 4 horas para serem remuneradas no sábado do empregado bancário (e não oito).
Contudo, como se verá adiante, com o entendimento de que o sábado é dia de repouso remunerado, não se pode chegar à mesma conclusão.
Pela construção jurisprudencial encartada na súmula 113 do TST, como já dito, o sábado do bancário é um dia atípico, pois apesar de não ser trabalhado, é remunerado e apesar de ser remunerado e não trabalhado, o que torna esse dia muito parecido com o domingo (repouso semanal remunerado), não tem o mesmo status do domingo, único dia da semana a ser legalmente considerado como repouso semanal remunerado, o que impede a repercussão das horas extras realizadas durante a semana, na medida em que o sábado não é considerado dia de repouso remunerado e sim dia útil não trabalhado.
Algumas normas coletivas, considerando que o bancário, por disposição legal, não trabalha aos sábados, passaram a dispor que esse dia (assim como o domingo) é dia de repouso semanal remunerado, o que, considerando o entendimento que vinha sendo aplicado pelo TST, permitiria que eventuais horas extras realizadas durante a semana também refletissem no sábado, impedindo a aplicação da súmula 113 do TST.
Em 2008, SANTOS já alertava sobre o equívoco do entendimento de que o sábado era “dia útil não trabalhado” e não repouso semanal remunerado. Na mesma oportunidade, informava que as entidades sindicais representativas das partes já se insurgiam em face desse entendimento, pactuando por normas coletivas que o sábado é dia de repouso remunerado:
“Esse entendimento jurisprudencial vai de encontro ao que o cidadão médio intui do fenômeno e, como sói suceder com tudo quanto é artificioso, rui aos poucos. A reação àquela jurisprudência fez-se por meio de reconhecimento em normas coletivas (convenções coletivas, acordos coletivos e sentenças normativas), de que o sábado era dia destinado ao repouso e devidamente remunerado.” (Op., cit. p. 201)
Alguns advogados viram nas normas coletivas que estipulavam ser o sábado um dia de repouso a oportunidade para retomar a discussão sobre o divisor do bancário, uma vez que o entendimento que dava sustentação ao divisor 180 e 220 estava assentado no fato de ser o sábado um dia útil não trabalhado (e remunerado) e agora o sábado havia passado a ser repouso semanal remunerado.
A tese encontrou eco em parte da jurisprudência trabalhista de primeira e segunda instância e também no TST, o que levou a mais alta Corte Trabalhista, em 14.09.2012, ao cancelamento da súmula 267 e à alteração da redação da súmula 124, que passou a contemplar o divisor 150 para os bancários sujeitos à jornada de seis horas, e divisor 200 para os bancários sujeitos à jornada de oito horas, caso haja ajuste individual ou coletivo para considerar o sábado como dia de repouso remunerado.
A súmula 124 do TST passou a ter a seguinte redação:
“BANCÁRIO. SALÁRIO-HORA. DIVISOR (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
I – O divisor aplicável para o cálculo das horas extras do bancário, se houver ajuste individual expresso ou coletivo no sentido de considerar o sábado como dia de descanso remunerado, será:
a) 150, para os empregados submetidos à jornada de seis horas, prevista no caput do art. 224 da CLT;
b) 200, para os empregados submetidos à jornada de oito horas, nos termos do § 2º do art. 224 da CLT.
II – Nas demais hipóteses, aplicar-se-á o divisor:
a)180, para os empregados submetidos à jornada de seis horas prevista no caput do art. 224 da CLT;
b) 220, para os empregados submetidos à jornada de oito horas, nos termos do § 2º do art. 224 da CLT.”
A modificação da súmula baseou-se em precedente da Seção de Dissídios Individuais n. 1 do TST, a exemplo do abaixo transcrito:
“BANCÁRIO. DIVISOR 150. NORMA COLETIVA. PREVISÃO NO SENTIDO DE QUE O SÁBADO É DIA DE REPOUSO REMUNERADO. 1. O divisor de horas extras é obtido a partir da multiplicação por 30 do número de horas da jornada. Tal assertiva deriva da interpretação lógico-gramatical da parte final do artigo 64 da Consolidação das Leis do Trabalho. 2. No caso dos empregados bancários, a jornada a ser considerada no cálculo é a de seis horas, por imposição expressa do artigo 224 da CLT. Obtém-se, assim, o divisor 180, extraído da multiplicação por 30 das seis horas da jornada. Tal entendimento foi explicitamente consagrado na Súmula n.º 124 deste Tribunal Superior, na qual consta que, para o cálculo do valor do salário-hora do bancário mensalista, o divisor a ser adotado é 180 . Ademais, este Tribunal Superior, por meio da Súmula n.º 113, consolidou posicionamento no sentido de que o sábado do bancário é dia útil não trabalhado, não dia de repouso remunerado .3. No entanto, registrou o Tribunal Regional que, no caso vertente, houve expressa previsão convencional no sentido de considerar o sábado como dia de repouso. Infere-se, assim, que a hipótese não comporta a aplicação dos posicionamentos cristalizados nas Súmulas de n. os 113 e 124, uma vez que o sábado não pode ser reputado simplesmente como dia útil não trabalhado, mas, sim, dia de repouso. 4. Tal circunstância legitima a aplicação do divisor pleiteado pela reclamante, visto que impõe a obtenção da média diária – divisão por 6 do total da jornada trabalhada durante a semana e, somente após, a multiplicação por 30, resultando no divisor 150. Precedente desta Primeira Turma. Recurso de revista conhecido e provido.
(…)
Como se vê, o julgado transcrito parte da premissa de que, diante de expressa previsão convencional no sentido de considerar o sábado como dia de repouso, não se há de falar na aplicação dos posicionamentos cristalizados nas Súmulas n°s 113 e 124, uma vez que o sábado não pode ser reputado dia útil não trabalhado, e, sim, dia de repouso, e, em tal circunstância, legítima a aplicação do divisor pleiteado, visto que impõe a obtenção da média diária – divisão por 6 do total da jornada trabalhada durante a semana e, somente após, a multiplicação por 30, resultando no divisor 150.
Assim, restando claro no quadro fático descrito pelo Tribunal regional, devidamente transcrito na decisão recorrida, que na hipótese dos autos consta em norma coletiva que o sábado é considerado repouso remunerado, divergente se afigura a tese defendida no aresto, pois não há ali a exigência firmada na decisão embargada de que deveria constar em norma coletiva a adoção do divisor de 150.
Assim, conheço do recurso por divergência.
2 – MÉRITO
Discute-se nos autos sobre o divisor a ser aplicado ao empregado bancário quando existe norma coletiva de trabalho incluindo o sábado como dia de repouso remunerado.
Da transcrição do acórdão do Tribunal Regional reproduzida na decisão recorrida demonstra-se que, na hipótese dos autos, a norma coletiva de trabalho incluiu o sábado como repouso semanal remunerado.
Em regra, o sábado é considerado dia útil não trabalhado, e não dia de repouso remunerado, salvo norma coletiva em contrário (Súmula n° 113 do TST).
Nos termos do art. 224, caput, da CLT, a “duração normal do trabalho dos empregados em banco será de seis horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 horas de trabalho por semana”. Assim, laborando 6 (seis) horas em cada dia útil, considerando-se os sábados como de 6 (seis) horas, e multiplicando-se essas horas por 30 (trinta), número de dias do mês, chega-se ao divisor 180, que deve ser aplicado no cálculo das horas extraordinárias do empregado bancário para saber o valor da hora normal (Súmula n° 124 do TST).
Todavia, existem casos de empregados bancários que são regidos por norma coletiva que inclui o sábado como dia de repouso remunerado, e, assim, a jornada semanal deve ser aquela efetivamente laborada, em observância ao comando constitucional insculpido no art. 7º, inciso XXVI.
No cálculo das horas extraordinárias, leva-se em conta a carga horária real de 30 (trinta) horas que os bancários efetivamente laboravam, e não a fictícia carga horária de 36 (trinta e seis) horas. Assim, o divisor a ser aplicado no cálculo do valor da hora extraordinária é 150, e não 180.” (ERR 74500-56.2007.5.15.0064 – Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 25.05.2012/J-17.05.2012 – Decisão unânime)
Da decisão que serviu como precedente para alteração da súmula 124 do TST observa-se que o principal fundamento reside no fato de que, diante da expressa previsão em norma coletiva de se considerar o sábado como dia de repouso não se pode aplicar os posicionamentos cristalizados nas súmulas 113 e 124 do TST, pois o sábado deixou de ser considerado dia útil não trabalhado e passou a ser considerado dia de repouso remunerado, o que legitima a aplicação do divisor 150, uma vez que a média de horas diárias deve ser obtida mediante a divisão por 6 e a multiplicação por 30, o que resulta no divisor 150.
O raciocínio utilizado na referida decisão é o seguinte:
– Total de horas trabalhadas na semana = 30
– Total de dias da semana = 6
– média diária de horas remuneradas = 30 ÷ 6 = 5
– total de horas remuneradas no mês = 5 x 30 = 150
Com todo o respeito que merecem as decisões do TST, a conclusão que firmou o entendimento de que o fato de norma coletiva estabelecer que o sábado é dia de repouso remunerado reduz o divisor de 180 para 150 é equivocada.
Na verdade, referida alteração, para os bancários sujeitos à jornada de 6 horas, interfere tão somente no reflexo das horas extras realizadas durante a semana, uma vez que passando a ser considerado como dia de repouso adquire o mesmo status do domingo, mas não interfere no divisor.
Assim, o único entendimento não aplicável da jurisprudência até então consolidada é o que consta da súmula 113 do TST, pois as horas extras passam a refletir também no sábado, mas não tem nenhuma interferência no divisor (exceção feita aos bancários sujeitos à jornada de oito horas, como se verá mais adiante).
Explico: o divisor é necessário para se encontrar o salário-hora, uma vez que esse valor é utilizado para a remuneração de alguns direitos trabalhistas, como, por exemplo, as horas extras.
Para se chegar ao valor do salário hora divide-se o valor do salário mensal pelo número de horas mensais por ele remuneradas. É preciso lembrar que são remuneradas não somente as horas trabalhadas, mas também aquelas destinadas ao repouso semanal, entendimento que se extrai do art. 64 da CLT.
Não é por outra razão que o divisor para a carga horária de 44 horas semanais é 220, pois a carga horária é dividida por 6 (dias úteis da semana) e multiplicada por 30 (total médio de dias do mês).
A divisão por 6 leva em consideração uma semana de 7 dias, sendo que desses, 6 dias são úteis e 1 dia é destinado ao repouso. Assim encontra-se a média de horas remuneradas de segunda a sábado (dias úteis) e multiplica-se por 30 para incluir o repouso semanal que, por lei (Lei n. 605/1949), deve ser remunerado.
No caso do trabalhador comum (44 horas semanais) o divisor 220 é encontrado a partir do seguinte raciocínio:
– Total de horas trabalhadas na semana = 44
– Total de dias úteis da semana = 6
– média diária de horas remuneradas = 44 ÷ 6 = 7,3333 (07h20)
– total de horas remuneradas no mês = 7,3333 x 30 = 220
No entendimento de que o sábado é dia útil não trabalhado, embora não conste de forma explícita, considera-se que o sábado é remunerado, pois somente dessa forma se chega ao divisor 180 para o bancário que trabalha 6 horas/dia. É que assim todos dos dias da semana são remunerados com seis horas. Os dias úteis trabalhados (segunda a sexta), os dias úteis não trabalhados, mas remunerados (sábados) e o repouso semanal remunerado (domingo), tal como representado no quadro a seguir:
Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado Domingo
Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil não trabalhado Repouso semanal remunerado
6 horas 6 horas 6 horas 6 horas 6 horas 6 horas 6 horas
Assim, a média de horas remuneradas por dia útil na semana é 6 horas, de modo que no mês, haverá a remuneração média de 180 horas (incluindo as seis horas do repouso semanal), o que conduz ao divisor 180 para se encontrar o salário hora.
O fato de haver ajuste individual ou coletivo estabelecendo que o sábado é dia de repouso remunerado, portanto, em nada influência na obtenção do divisor, pois a quantidade de dias remunerados na semana continua o mesmo, senão vejamos:
Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado Domingo
Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Dia útil trabalhado Repouso semanal remunerado Repouso semanal remunerado
6 horas 6 horas 6 horas 6 horas 6 horas 6 horas 6 horas
Como se observa, a transmudação do sábado de dia útil não trabalhado (mas remunerado) para dia de repouso remunerado em nada alterou a quantidade de dias remunerados na semana e, por consequência, no mês, de modo que não havia razão para a alteração do divisor de 180 para 150, pois o total de horas remuneradas continuou a ser 180/mês (para os bancários sujeitos à jornada de seis horas).
O raciocínio comparativo com o trabalhador comum, sujeito à carga horária de 44 horas semanais, não pode ser aplicado indiscriminadamente, na medida em que este tem apenas um repouso semanal remunerado e trabalha de segunda a sábado. Já o bancário com previsão normativa ou individual de que o sábado é dia de repouso remunerado trabalha de segunda a sexta e tem dois dias de repouso semanal remunerado na semana.
Caso se pretenda aplicar o mesmo raciocínio utilizado para se encontrar o divisor 220, aplicado na carga horária de 44 horas semanais, para bancário sujeito à jornada de 6 horas, com norma estabelecendo que o sábado é repouso remunerado, não se pode esquecer que no primeiro caso há apenas um repouso semanal remunerado e no segundo caso há dois repousos semanais remunerados.
Nessa situação o divisor deve ser encontrado da seguinte forma:
– Total de horas trabalhadas na semana (segunda a sexta) = 30
– Média de horas remuneradas por dia trabalhado = 30 ÷ 5 = 6 (considerando que o sábado é dia de repouso remunerado, não se pode dividir a carga horária semanal por 6, como foi afirmado na decisão que serviu como precedente para a alteração da súmula 124 do TST onde se chegou ao divisor 150)
– Total de horas remuneradas no mês: (30 ÷ 5) x 30 = 180 (a multiplicação por 30 inclui os dois dias de repouso remunerado por semana, ou seja, o sábado e o domingo).
Como se percebe, a afirmativa feita por ocasião do julgamento do processo ERR 74500-56.2007.5.15.0064, um dos precedentes que levou à revisão da súmula n. 124 do TST, no sentido de que “No cálculo das horas extraordinárias, leva-se em conta a carga horária real de 30 (trinta) horas que os bancários efetivamente laboravam, e não a fictícia carga horária de 36 (trinta e seis) horas.” é equivocada, pois mesmo levando-se em consideração a carga horária real de 30 horas semanais (e não a carga horária fictícia de 36 horas semanais), resultante do entendimento de que, pelo fato de serem dois os repousos semanais remunerados na semana, não se pode fazer a divisão por 6, pois são 5 os dias úteis da semana, e a média de horas remuneradas por dia continua a ser 6, e no mês continua a ser 180.
Assim, para o bancário sujeito à jornada de 6 horas, ainda que haja previsão de que o sábado é dia de repouso remunerado, o divisor continua a ser 180, e não 150 como consta da nova redação da súmula 124 do TST.
A questão foi muito bem colocada durante o julgamento do processo 00513.2011.005.23.00-8 pela Primeira Turma do TRT da 23ª Região, realizado um pouco antes de ser alterada a redação da súmula 124 do TST e relatado pelo Desembargador Osmair Couto. Transcrevo ementa do referido julgado:
(…) HORAS EXTRAORDINÁRIAS. DIVISOR 150. IMPOSSIBILIDADE. SÁBADO: REPOUSO REMUNERADO. DIVISOR 180. SÚMULAS N. 113 E 124 DO TST. O cálculo do divisor para obtenção do salário-hora não deve incluir os dias de repouso remunerado em sua fórmula, de modo que tal equação deve espelhar a divisão entre o número de horas trabalhadas na semana pelo número de dias úteis remunerados multiplicado por 30, que são os dias do mês nos termos da CLT. Desse modo, sendo o sábado, por força de norma convencional, dia de ‘repouso remunerado’ e não ‘dia útil não trabalhado’, como consubstanciado na súmula 113 do TST, não deverá esse dia integrar a aritmética para a obtenção do divisor. Dessarte, sendo de 30 horas a jornada da Autora e sendo cinco (segunda a sexta) os dias úteis a que se submetia durante a semana, dividindo-se 30 por 5 e multiplicando-se o resultado por 30 obter-se-á o divisor 180. Assim, a aplicação da súmula n. 124 do TST, nos casos para os quais o sábado seja dia de repouso, é correta. Recurso da Autora a que se nega provimento. (…)” (Julgado em 28/08/12,Publicado em 29/08/12)
Para a melhor compreensão do assunto transcreve-se na íntegra o teor do julgado quanto a esse tema, a fim de que se possa perceber os argumentos utilizados pelo recorrente, que defendia a utilização do divisor 150, conforme precedentes do TST, bem como os argumentos do Relator, para a manutenção da sentença que decidiu pela utilização do divisor 180:
“HORAS EXTRAORDINÁRIAS.DIVISOR 150
(recurso da Autora)
Almeja a Autora, ora Recorrente, a reforma da decisão originária para que seja deferido o pleito relativo à utilização do divisor 150 para fins dos cálculos relativos às horas extraordinárias deferidas na sentença.
Argumenta, a princípio, que não houve impugnação específica do Réu no que se refere à utilização do aludido divisor. (De pronto, registre-se que tal alegação é insubsistente, pois se verifica na defesa a específica contestação – fl. 210, tópico “do divisor”).
Pondera que instou o juízo de primeiro grau a manifestar-se especificamente sobre a matéria por meio de embargos declaratórios (fls. 552/553) e que a decisão originária equivocadamente rejeitou tal pedido, visto que “o resultado proclamado decorre de um sofisma que pode ser facilmente desconstituído”.
Propala que, por simples operação aritmética, é possível a obtenção do divisor 150, visto que: “se o número 220 é o divisor para a jornada de trabalho de 44 horas semanais, para 30horas semanais o número do divisor é x, onde x é igual:
X= 30 x 220 ÷ 44 = 150”
Alega que para a definição do divisor 180 a sentença aplicou “raciocínio inexato” e que as “variáveis que orientaram o entendimento da súmula n. 124 do TST são: 36 horas semanais (e não 30), dividindo por 6 dias na semana, encontra-se 6 que, multiplicado por 30 resultou em 180 .”
Argumenta que a conclusão relativa à utilização do divisor 180 “excede ao absurdo” , pois esse “serviria para duas grandezas matemáticas diferentes: para a jornada de 36 horas semanais, divisor 180 ; para a jornada de 30 horas semanais, divisor 180 “.
Afirma que tal proceder (considerar o divisor 180 tanto para a jornada de 30 como de 36 horas semanais) significaria que trabalhadores com jornadas diversas teriam o mesmo salário-hora.
Frisa, ainda, “que o divisor previsto na súmula n. 124 do TST tem por pressuposto o sábado como dia útil não trabalhado, tal como espreita a súmula n. 113 do TST,” mas “que os acordos coletivos de trabalho, posteriores às citadas súmulas, incluíram o sábado como dia de repouso semanal remunerado.”
Por conseguinte, a Autora pugna pelo afastamento da súmula n. 124 do TST.
Aduz também que a utilização do divisor 180 “revela-se como redutor clandestino do adicional de horas extras previsto no item XVI do art. 7º da CF”. Bem assim, que a sentença teria violado o art. 619 da CLT, bem como os acordos coletivos de fls. 97 a 165.
Enfim, requer aplicação da mesma inteligência consubstanciada na decisão dos E-RR 250700-26.2006.5.15.0007, da SBDI-1 do c. TST, rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, em que é aplicado o divisor 150, concluindo, em síntese, que “no cálculo das horas extras, leva-se em conta a carga horária real de 30 (trinta) horas que os bancários efetivamente laboravam, e não a fictícia carga horária de 36 (trinta e seis) horas. Assim, o divisor a ser aplicado é 150, e não 180 .”
As contrarrazões, por seu turno, requerem pela manutenção da sentença, porquanto entendem que a aplicação da súmula n. 124 do TST é correta à hipótese. Colacionam arestos do TRT da 2ª Região para corroborar a antítese recursal.
Da detida análise das circunstâncias que permeiam o caso concreto, conclui-se que razão não assiste à Autora.
Em que pese a decisão da c. SBDI-1 do TST trazida com o apelo, cujos valorosos argumentos poderiam fazer com que fosse declarada a incidência do divisor “150” ao caso concreto, vê-se que a inteligência naquela aplicada, com a devida vênia, não apresenta a melhor solução à hipótese.
A análise dos divisores para o cálculo do salário-hora, numa interpretação histórica da matéria, leva-nos a conclusão de que os parâmetros indicados no apelo à obtenção do divisor 150 são incorretos.
Isso pois, a utilização da regra de três simples proposta no recurso ordinário deixa de observar que o cálculo para o divisor 220 observa o labor de 44 horas semanais em seis dias úteis (segunda a sábado) com 1 dia de descanso (domingo) ao passo que no presente caso tem-se labor em cinco dias úteis (segunda a sexta) com 2 dias de descanso (sábado e domingo). Portanto, para situações distintas incogitável a utilização dessa tradicional regra matemática.
Afinal, embora a redução da jornada de trabalho propicie a diminuição do divisor para a apuração do salário-hora tem-se que, no específico caso dos bancários, tal não ocorre, pois o que houve em verdade não foi alteração da quantidade de horas laboradas que continuou a ser de 30 horas, mas sim da quantidade de dias úteis na semana e dos respectivos dias não-úteis de descanso.
Nessa linha de raciocínio, os acordos coletivos entabulados com os funcionários do Réu transmudaram a costumeira natureza jurídica do sábado, de modo que esse passou a ser um segundo repouso semanal e não mais um “dia útil não trabalhado”.
Tal proceder não é prejudicial aos empregados que passam a ter, por exemplo, uma ampliação dos reflexos das horas extras nesse segundo dia de repouso remunerado, conforme o reconhecido na sentença. Ademais, eventual labor no sábado, enquanto dia de repouso, enseja o pagamento em dobro nos moldes preconizados pela Lei 605/49.
Portanto, tem-se que tal norma é plenamente válida e não importa em qualquer prejuízo além de revelar-se como capaz de tornar mais equânime as relações econômicas, sociais e jurídicas decorrentes da ausência de prestação de serviço aos sábados pelos bancários em face dos demais empregados regidos pela CLT.
Desse modo, essas normas convencionais acabam por afastar a incidência da súmula n. 113 do TST, bem como tornam impossível a utilização da regra de três simples tendo como parâmetro os empregados “comuns” (que usam divisor “220” e laboram 44 horas semanais) para o alcance do divisor aplicável aos bancários protegidos pelo espectro de tais normas.
Sendo assim, entendo que o raciocínio adequado ao caso é o já ponderado na decisão de primeiro grau que bem fixou o divisor 180 , a partir da seguinte fórmula: número de horas semanais normais fixadas para a categoria divididas pelo número de dias úteis destinados aos trabalhos na semana multiplicado por 30, que é o número de dias do mês, conforme previsão da CLT.
Frise-se que reputo adequada a fórmula adotada pela magistrada de primeiro grau, uma vez os parâmetros utilizados ao longo da história observam essa matemática, pois, os repousos remunerados não entram no cômputo do divisor para cálculo do salário-hora, tendo tal lógica, inclusive, se tornado um costume jurídico.
Nessa linha, o seguinte quadro elucida a questão:
JORNADA SEMANAL (x) QTD DIAS ÚTEIS TRABALHADOS (y) FÓRMULA DIVISOR (z)
48 horas 6 (segunda a sábado) (x ÷ y)30 = z 240
44 horas 6 (segunda a sábado) (x ÷ y)30 = z 220
40 horas 6 (segunda a sábado) (x ÷ y)30 = z 200
36 horas 6 (segunda a sábado) (x ÷ y)30 = z 180
30 horas 5 (segunda a sexta) (x ÷ y)30 = z 180
Vê-se, pois, que se adotando a fórmula utilizada pelo juízo singular, confere-se tratamento igual aos trabalhadores de modo a não se estabelecer diferenças injustificáveis à luz do atual sistema jurídico regido a partir das disposições da CF/88.
Desse modo, em face do costume (art. 8º da CLT) adotado em relação a fórmula acima destacada, conclui-se que as alegações recursais se mostram incorretas.
Face ao exposto, nega-se provimento.”
O raciocínio é o mesmo para o bancário que trabalha 8 (oito) horas por dia, de segunda a sexta.
segunda Terça quarta quinta sexta sábado domingo
Dia útil
trabalhado Dia útil
trabalhado Dia útil
trabalhado Dia útil
trabalhado Dia útil
trabalhado Repouso semanal remunerado Repouso semanal remunerado
8 horas 8 horas 8 horas 8 horas 8 horas 8 horas 8 horas
Ou seja, o bancário que trabalha oito horas por dia, de segunda a sexta e fez ajuste individual ou coletivo para que o sábado seja dia de repouso remunerado, embora trabalhe 48 horas na semana é remunerado, na verdade, por 56 horas semanais, o que redunda em 240 horas no mês, pois esse bancário trabalha, na semana, por 5 dias na jornada de oito horas, e recebe por cada um dos dois dias de repouso 8 horas, totalizando as 56 horas remuneradas na semana. Considerando que o mês tem, em média, 4,2857 semana (30 ÷ 7), se multiplicarmos o total de horas remuneradas na semana pela quantidade de semanas existentes no mês, encontraremos 240 (30 x 4,2857 = 240). O mesmo resultado se consegue pela aplicação do art. 64 da CLT.
Dessa forma, se com o entendimento de que o sábado é dia útil não trabalhado até se admite imposição do divisor 220, decorrente da limitação constitucional da carga horária semanal em 44 horas, na medida em que, sendo o sábado considerado dia útil, caso fosse trabalhado não se poderia ultrapassar o limite de 44 horas, o mesmo não ocorre quando o entendimento é de que o sábado é dia de repouso remunerado, pois nessa situação, considerando que de segunda a sexta-feira a jornada é de 8 horas e o sábado, assim como o domingo, é considerado dia de repouso e tanto um como outro é remunerado com a média de horas trabalhadas nos dias úteis existentes na semana- 8 horas – de modo que todos os dias da semana são remunerados com 8 horas, e pela aplicação do art. 64 da CLT, que disciplina como se deve encontrar o salário-hora, chega-se ao divisor 240, e isso significa que esse trabalhador é remunerado por 240 horas/mês.
SANTOS (2008, p. 135), justificando a comparação entre o empregado comum, sujeito a jornada de 8 horas, com folga aos sábados e o bancário sujeito à jornada de 8 horas, de segunda a sexta, pondera:
“O paradoxo está em que a limitação constitucional de 44 horas semanais não altera em nada a duração do trabalho ou a remuneração do bancário, razão pela qual não há razão lógica e jurídica para reduzir o seu divisor de 240 para 220.”
Mais, adiante, ele (2008, p. 137) afirma:
“Seria correto afirmar que quem trabalha 40 horas semanais (8 horas diárias de segunda a sexta-feira) está sujeito ao divisor 200 apenas se o empregado recebesse como repouso remunerado apenas o domingo…” (sem destaque no original – Op., cit., p. 137).
Cabe ressaltar que a limitação constitucional a um máximo de trabalho em 44 horas semanais em nada afetou o trabalhador bancário, que já estava submetido, por lei, à jornada inferior (30 ou 40 horas semanais), de modo que se o sábado, assim como o domingo, for considerado dia de repouso remunerado, não há razões plausíveis para que não se utilize o divisor 240.
Poderão argumentar que a utilização de divisor maior do que o utilizado para o trabalhador comum vai de encontro ao objetivo das leis que reduziram a jornada do bancário, mas tal argumento não deve prevalecer, pois, se por um lado, o salário-hora será menor, por outro, terá ele dois dias de repouso na semana e caso haja a realização de trabalho em condições especiais (em horas extras, em horário noturno, por exemplo), o reflexo não se limitará ao domingo, incidindo também aos sábados.
O trabalho realizado aos sábados também deverá ser remunerado da mesma forma que o trabalho realizado aos domingos, pois também será considerado dia de repouso.
Além do mais, também foi objetivo da lei conferir um repouso semanal mais prolongado, de modo que caso haja a previsão em norma coletiva no sentido de ser o sábado dia de repouso remunerado, em prestígio à autonomia privada coletiva (art. 7, XXVI, da CF/1988), não há razões para negar as consequências dessa pactuação.
Um dos objetivos almejados pelos trabalhadores, de modo geral, é a ampliação dos dias de repouso remunerado. Contudo, essa benesse deve vir com as suas consequências naturais, inclusive a possível ampliação do divisor e a consequente redução do salário-hora.
O equívoco da nova redação da Súmula 124 do TST em relação ao bancário que tenha pactuado o sábado como repouso semanal remunerado e sujeito à jornada de oito horas fica mais evidente se comparado à Súmula 431 do TST, que fixa o divisor 200 para o empregado comum, sujeito 40 horas semanais e, naturalmente, com apenas um repouso semanal remunerado.
Eis o teor da mencionada Súmula 431 do TST:
SUM-431 SALÁRIO-HORA. EMPREGADO SUJEITO AO REGIME GERAL DE TRABALHO (ART. 58, CAPUT, DA CLT). 40 HORAS SEMANAIS. CÁLCULO. APLICAÇÃO DO DIVISOR 200 (redação alterada na sessão do tribunal pleno realizada em 14.09.2012) – Res. 185/2012 – DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora.
Ora, como comparar o empregado bancário, sujeito à jornada de 40 horas semanais, mas com dois dias de repouso semanal remunerado, com o empregado comum, se este possui apenas um dia de repouso semanal remunerado.
Há, aqui, um tratamento igual entre desiguais, o que assentua a desigualdade existente entre esses dois trabalhadores.
Em conclusão, a eventual existência de ajuste individual ou coletivo no sentido de estabelecer que o sábado passe a ser considerado dia de repouso remunerado não tem, para o bancário sujeito à jornada de 6 horas, o condão de alterar o número de horas remuneradas no mês em relação ao tradicional entendimento de que o sábado é dia útil não trabalhado, de modo que o divisor continua a ser o de 180, não havendo razão lógica nem jurídica para que se reduza o divisor para 150.
Já para o bancário sujeito à jornada de 8 horas, o que se observa é que a se considerar o sábado como dia de repouso remunerado, em hipótese alguma poderá haver a redução do divisor para 200, tal como utilizado para os demais trabalhadores (não bancários), pois estes possuem apenas um descanso semanal remunerado, ao passo que os bancários que pactuaram que o sábado é descanso semanal remunerado passaram a ter dois descansos semanais remunerados na semana. Nessa condição, o divisor é 240, pois o empregado será remunerado por 8 horas em todos os dias da semana.
Considerando que a partir do momento em que uma matéria é sumulada, os Tribunais estão autorizados, por aplicação do art. 557 do CPC, a não conhecer dessa matéria quando trazida em recurso, bem como, pela aplicação da súmula 333 do TST, os recursos de revista que objetivarem discutir esse tema, caso a decisão recorrida esteja de acordo com súmula, sequer serão conhecidos, é recomendável que o TST reveja com urgência a súmula 124 de sua jurisprudência e, pelo menos, restabeleça a redação anterior, como forma de se permitir uma maior discussão acerca dos efeitos da concessão de mais de um repouso semanal remunerado na semana e de se estabelecer a aplicação adequada do princípio da isonomia entre todos os trabalhadores que atuam na sociedade jurídico-constitucional brasileira, evitando-se causar maiores transtornos aos jurisdicionados.
Outrossim, por meio desses argumentos a serem buscados no material coletado, pretende-se justificar a incorreção da nova redação da súmula e sua necessidade de retorno ao status quo ante como forma, inclusive, de se estabelecer a aplicação adequada do princípio da isonomia entre todos os trabalhadores que atuam na sociedade jurídico-constitucional brasileira.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Súmulas, orientações jurisprudenciais: tribunal pleno/órgão especial, SBDI-I, SBD-I transitória, SBDI-II e SDC; precedentes normativos. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/Livro-Jurisprud-13-03-2013-igual-IRem.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2013.
Autores
Renato de Oliveira Luz é analista judiciário do TRT da 23ª Região, bacharel em Direito e assessor do Desembargador Osmair Couto no TRT da 23ª Região
Marlon Carvalho de Sousa Rocha é técnico judiciário do TRT da 23ª Região, bacharel em Direito e assessor do Desembargador Osmair Couto no TRT da 23ª Região